O material “Cuidar e proteger: infâncias e adolescências em tempos de crise climática” traz recomendações à rede de proteção de crianças e adolescentes, que abrangem desde os cuidados em alojamentos temporários até os canais de denúncia e comunicação
Diante do agravamento dos eventos climáticos extremos no Brasil e no mundo, como as enchentes no Rio Grande do Sul em 2024, que afetaram milhões de pessoas e interromperam o acesso à educação, saúde e moradia, o Instituto Alana lança, em parceria com o Conanda (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente) e Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC), o guia “Cuidar e proteger: infâncias e adolescências em tempos de crise climática”, que busca fortalecer e ampliar o alcance do documento “Recomendação do Conanda para a proteção integral a crianças e adolescentes em situação de riscos e desastres climáticos”, publicado em 2024.
O material, apresentado durante a Semana Nacional de Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes, realizado em Brasília, em alusão aos 25 anos de mobilização do 18 de maio, Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, oferece diretrizes práticas para que gestores públicos, conselheiros tutelares e diferentes profissionais do Sistema de Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente (SGDCA) estejam preparados para enfrentar os impactos da crise climática com foco na proteção integral de meninos e meninas.
“Colocar crianças e adolescentes no centro das políticas públicas e sociais é essencial para garantir que enfrentemos os desafios climáticos com justiça, equidade e cuidado”, afirma Ana Claudia Cifali, coordenadora jurídica do Instituto Alana e conselheira do Conanda. “Como evidenciado no episódio do Rio Grande do Sul, a mobilização da sociedade civil é essencial em momentos de crise. Porém, é fundamental que o Estado esteja preparado para assumir sua responsabilidade na gestão dessas situações, com serviços e profissionais capacitados para prestar os atendimentos necessários e garantir a proteção integral de crianças e adolescentes”, completa.
Recomendações do guia
O documento orienta, por exemplo, a criação de Comitês de Proteção nos âmbitos estadual e municipal, que devem atuar em parceria com o SGDCA para mapear necessidades e articular respostas eficazes. Destaca-se também a importância de garantir condições adequadas de trabalho aos Conselhos Tutelares, preservar o funcionamento dos serviços essenciais – como saúde, educação e assistência social – e realizar contratações emergenciais. O texto ainda propõe o uso de recursos do Fundo Nacional para a Criança e o Adolescente (FNCA) em contextos de calamidade, bem como o envio das forças nacionais do Sistema único de Saúde (SUS) e Sistema Único de Assistência Social (SUAS) para apoiar os atendimentos.
Outros pontos fundamentais incluem o cuidado com a saúde mental dos profissionais envolvidos, o apoio a crianças em situação de orfandade ou com deficiência, a preservação do direito à informação e à participação ativa de crianças e adolescentes nas decisões que os afetam, além da implantação de medidas como renda básica emergencial e suporte a famílias.
Sobre os alojamentos provisórios criados em situações de emergência climática, a publicação detalha as condições mínimas para garantir segurança, dignidade e cuidado. O Conanda recomenda, por exemplo, a nomeação de equipes técnicas com presença constante nos alojamentos, organização de espaços específicos para mulheres, crianças e adolescentes, e a criação de ambientes lúdicos e apropriados à infância. Para bebês e crianças de até seis anos, devem ser oferecidos fraldários, espaços de amamentação e áreas de convivência. É igualmente necessário o monitoramento da saúde, identificação segura das crianças, encaminhamento adequado de crianças desacompanhadas e a prevenção de qualquer forma de violência, por meio de canais de denúncia acessíveis e confiáveis.
As recomendações para a gestão pública abordam o papel dos Comitês de Proteção, Conselhos Tutelares, profissionais da saúde e da segurança pública. Os comitês devem monitorar continuamente os alojamentos, mapear a população atendida e organizar fluxos de atendimento e comunicação. Já os Conselhos Tutelares são orientados a criar escalas de plantão, fiscalizar os espaços, garantir a prioridade de suas requisições e registrar os atendimentos no Sistema de Informação para Infância e Adolescência (SIPIA). Na saúde, as ações envolvem desde o atendimento pré-natal até a vacinação, o fornecimento de medicamentos e o atendimento ambulatorial e hospitalar. No campo da segurança pública, recomenda-se a presença das forças policiais nos alojamentos, a orientação às famílias sobre riscos de retorno a áreas afetadas e o fortalecimento da vigilância contra o tráfico de crianças e adolescentes.
No que se refere ao sistema socioeducativo e ao acolhimento institucional ou familiar, o guia “Cuidar e Proteger” recomenda que se mantenha a comunicação entre adolescentes e suas famílias, a transferência de adolescentes de unidades em áreas de risco, e a suspensão de medidas socioeducativas em meio aberto – como Liberdade Assistida e Prestação de Serviço à Comunidade – durante o período de calamidade, com reavaliação posterior.
O documento destaca ainda a importância de oferecer canais acessíveis e seguros para denúncias, informações e pedidos de ajuda. O Disque 100, o atendimento por WhatsApp, Telegram e Libras são apontados como ferramentas essenciais. Os governos devem garantir que essas informações sejam amplamente divulgadas e compreensíveis para diferentes públicos, inclusive crianças e adolescentes, com formatos adaptados às suas idades e condições.
Canais de denúncia
Por fim, o guia lista os principais canais de denúncia para violações de direitos, reforçando que é dever do Estado assegurar a proteção de crianças e adolescentes mesmo em contextos extremos. A publicação reafirma que a crise climática é também uma crise dos direitos da infância, e que enfrentá-la requer ações coordenadas, inclusivas e sensíveis às múltiplas vulnerabilidades.
O guia completo está disponível neste link e é um chamado urgente para que governos e sociedade civil atuem de forma articulada na construção de um presente e futuro mais seguro, justo e sustentável para todas as infâncias e adolescências.