Foto na volta às aulas. Uma professora auxilia uma criança que está sentada em uma carteira escolar fazendo a lição. Todos usam máscaras de proteção.

Volta às aulas: somar forças para garantir retorno seguro

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Nos últimos dois anos, com a Covid-19, o Brasil tem enfrentado inúmeros desafios na efetivação do direito à educação. Estamos diante de um quadro em que as condições de ensino remoto e a volta às aulas presenciais estão ocorrendo de forma desigual. Isso aumenta o risco de abandono e evasão de uma parcela da população em idade escolar, sobretudo dos estudantes em situações mais vulnerabilizadas. Nesse cenário, crianças e adolescentes são os mais afetados.

A crise provocada pela pandemia gerou uma situação só constatada anteriormente em períodos de guerras e desastres naturais. Estudos sistematizados demonstram que situações similares ocorridas no século passado trouxeram implicações na vida dos estudantes de maneira permanente. Crianças que deixam as escolas durante crises têm apenas 30% de probabilidade de continuarem os estudos.

Exclusão escolar

Agora, o país corre o risco de regredir duas décadas no acesso à educação. Dados sobre o cenário nacional da exclusão escolar mostram que, em 2019, havia cerca de 1,1 milhão de crianças e adolescentes fora do ensino formal. Em novembro de 2020, o número era de 5,5 milhões. Já no segundo semestre de 2021, houve um aumento de 171,1% no número de crianças de 6 a 14 anos fora das escolas em relação ao mesmo período de 2019, revela um levantamento mais recente. 

Por isso, é fundamental realizar a busca ativa daqueles que estão fora da escola e assegurar o regresso de todos os estudantes às salas de aula. E isso depende, necessariamente, do apoio, da concentração e da coordenação de esforços de famílias, sociedade e Estado. Isso garante que condições seguras de retorno sejam garantidas para todas as crianças e todos os adolescentes. Somente com o compromisso de cada um será possível recuperar as aprendizagens e combater a exclusão educacional e social.

A escola é o equipamento social

Com o intuito de mobilizar famílias e estudantes evadidos durante a pandemia a aproveitarem o período de matrícula e garantirem sua vaga, mais de 30 organizações da sociedade civil de todo o país, incluindo o Instituto Alana, se somaram à campanha Bora Pra Escola, um chamado para a volta às aulas. 

Nesse contexto, é importante ressaltar que o retorno às aulas com atendimento presencial neste início de ano letivo, especialmente para a faixa etária com cobertura vacinal garantida (dos 5 aos 17 anos e 11 meses), gera mais efeitos positivos aos estudantes do que negativos, mesmo em meio à onda de contágios devido à variante ômicron. Isso porque o direito à saúde e o direito à educação não são opostos e são plenamente possíveis de serem assegurados de maneira concomitante. Fechar escolas ou protelar a abertura delas é uma grande violação dos direitos das crianças e dos adolescentes.

Ao longo da pandemia, a literatura científica e as experiências exitosas em cidades brasileiras e no âmbito internacional revelam que a escola é o equipamento social capaz de compensar impactos na saúde mental, proteção contra violências e os desdobramentos do aumento da pobreza (como a insegurança alimentar) decorrentes e intensificados pela crise sanitária e humanitária da Covid-19.

O ambiente escolar continua sendo um espaço coletivo seguro ao adotar medidas de proteção.

A bem-sucedida vacinação do público adulto brasileiro e a diminuição de casos graves nesta amostra (entre eles, os profissionais da educação) é outro fator que contribui para a retomada segura das aulas. O início da campanha da vacinação infantil também se mostra o principal aliado de um retorno seguro.

Considerando isso, a volta às aulas presenciais em 2022 deve acontecer de maneira coordenada e articulada entre diferentes atores sociais. Famílias, escolas, redes de ensino e poder público precisam de um esforço multidimensional nos âmbitos político, sanitário, pedagógico e social.

Para contribuir nesse debate, o Instituto Alana elenca questões importantes a serem garantidas em cada um destes âmbitos para a continuidade das atividades educativas, especialmente as presenciais, na vigência da pandemia.

1. Dimensão política

O direito à educação: uma responsabilidade de todos

A educação, junto com setores como saúde, assistência social e outras áreas da gestão pública dividem responsabilidades sobre um plano articulado para o enfrentamento dos efeitos da pandemia na educação. Além da característica multidimensional e intersetorial, esse conjunto de estratégias deve ser coordenado entre entes federativos distintos, como União, Estados e Municípios, levando em conta as evidências sanitárias e as determinações da ciência, em escuta e diálogo com os profissionais da educação e a comunidade escolar. 

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2. Dimensão pedagógica

O papel das redes de ensino e dos profissionais da educação

Estamos ingressando no terceiro ano de pandemia. Portanto, as condições para que as escolas estejam abertas de maneira segura (o que é possível e referendado pela literatura científica) já devem estar postas. A crise sanitária não começou agora: contamos com um acúmulo científico sobre contágio, prevenção e instrumentos de saúde coletiva disponibilizados, como a vacina. Não se pode admitir que, passados mais de dois anos letivos, uma rede ou escola não tenha construído, adaptado e aperfeiçoado sua infraestrutura escolar, protocolos sanitários, mobilização e conscientização da comunidade escolar, além de um currículo voltado para a recuperação de aprendizagens, identificação e encaminhamento de violências e violações. É assim que a escola cumpre seu papel social nos direitos à vida e à educação, que não são opostos e podem caminhar conjuntamente.

Nas escolas, é importante que os educadores estabeleçam critérios, medidas e protocolos adaptados a cada etapa de ensino, considerando suas especificidades legais e por segmento. Tendo em vista que as condições de aprendizagem foram afetadas pela Covid-19, deve-se colocar em primeiro lugar os direitos de desenvolvimento e aprendizagem dos estudantes: a recuperação das aprendizagens, os cuidados com a saúde integral, a prevenção e o encaminhamento de situações de violação de direitos das crianças e dos adolescentes.

Nenhum estudante deve ficar para trás, em nenhum aspecto de seu desenvolvimento cognitivo, físico e socioemocional.
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3. Dimensão das ciências da saúde

Ações de atenção primária à saúde

Garantir o direito à vida e à educação pressupõe fortalecer as ações de atenção primária à saúde da comunidade escolar e do entorno, reforçando medidas de prevenção, entre elas a mobilização da sociedade para a campanha de vacinação infantil contra a Covid-19, a disponibilização e o uso de máscaras, a higienização constante das mãos e o distanciamento ou a reorganização de turmas e horários que garantam a menor circulação de pessoas.

É importante ressaltar que as escolas, especialmente as públicas, atuam na rede de proteção social em ações em prol da saúde coletiva, em parceria com o Sistema Único de Saúde (SUS), nas campanhas de vacinação, controle e erradicação de doenças comunitárias e zoonose. Portanto, o início do ano letivo é uma oportunidade de reforçar a educação para a saúde coletiva. É principalmente na escola que se aprende a prevenir doenças e a agir de maneira responsável no cuidar de si, do outro e do meio ambiente. Ou seja, a pandemia é também um importante conteúdo de aprendizagem social e formação cidadã.

Efetivar o direito à educação também implica garantir investimento imediato na infraestrutura escolar, assegurando água potável, saneamento básico, ventilação cruzada nos ambientes fechados e uso, sempre que possível, de ambientes e áreas abertas e ao ar livre (além do uso de espaços externos do bairro e da cidade, como áreas naturais, praças e parques).

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4. Dimensão social

Desigualdades educativas

Nos últimos anos se constatou que, apesar dos esforços das redes de ensino em manter o direito à educação por meio de atividades remotas, a qualidade da aprendizagem caiu. Isso ampliou as desigualdades educativas entre crianças pobres e ricas, brancas e negras, moradoras de comunidades periféricas e dos centros, entre as que vivem nas cidades e as que vivem no campo e entre crianças com deficiência e sem deficiência. Vale ressaltar que as desigualdades educativas estão associadas às de gênero, raça, classe e condição de pessoa com deficiência, o que acentua violações de direitos de milhares de crianças e adolescentes.

Com até 200 dias letivos sem aula nas redes públicas e privadas brasileiras entre 2020 e 2021, se intensificou um fenômeno chamado de pobreza de aprendizagem (quando não se aprende aquilo que é esperado para determinada faixa etária), gerando consequências negativas em toda uma geração de crianças e adolescentes. A recuperação das aprendizagens é possível, porém, com o aumento da pobreza na vida das famílias de um modo geral, há que se ter um investimento público e estatal, esforço coletivo entre famílias e escolas e uma capacitação de profissionais ainda maior.

A escola é uma porta de entrada para o acesso e garantia de muitos direitos sociais. Entretanto, as trajetórias escolares estão atravessadas pelos reflexos das desigualdades sociais. Ações afirmativas, programas sociais de auxílio, reparação e compensação são urgentes para não aumentar, ainda mais, a assimetria de condições e oportunidades entre crianças e adolescentes.
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