Fenomenologia

A fenomenologia é o estudo da consciência e dos objetos que medeiam a consciência, ou seja, de tudo o que faz a mediação entre o sujeito e o objeto. É um termo recente cuja abordagem moderna parte da teoria do filósofo Edmond Husserl. Há, no entanto, diversas vertentes para esse campo de estudo. Entre elas, as mais recorrentes são a transcendental, do próprio Husserl; a hermenêutica, de Hans George Gadamer e Martin Heidegger; e a existencial, de Jean-Paul Sartre.

Do ponto de vista existencial, o filósofo Maurice Merleau-Ponty concebe, em seus cursos na Universidade de Sorbonne entre 1949 e 1952, o que é a criança. Para ele, do ponto de vista da fenomenologia, a criança não é egocentrada, mas mundocentrada. Isso significa que o modo existencial da infância é de descentramento, já que o ego da criança ainda não se encontra formado. Não há uma distinção clara entre o indivíduo e o ambiente: ela é ser no mundo.

Nesse sentido, a criança não representa: ela presentifica. Ela está um passo antes da reflexão: encontra-se no aqui e no agora. É uma presença muito próxima do que diversos artistas, das mais diferentes vertentes, pretendem chegar. Ela carrega uma temporalidade que aproxima-se do zen, daquilo que é anterior ao pensamento. E essa presença no mundo é praticada em cada gesto e em cada palavra, em suas relações cotidianas com adultos e com outras crianças.

A linha teórica que considera a criança como esse ser presente é denominada fenomenologia da infância, e defende ainda que devemos deixá-la ser o que ela é, nunca à deriva. Isso significa permitir que vivam suas infâncias “de maneira onírica, polimorfa, não representacional, a seu tempo, como é seu direito”, como lembra o antropólogo Victor Turner.

Na fenomenologia da criança, o trabalho antropológico deve ser bastante cuidadoso. Nele, encontra-se um grande desafio: descentralizar o olhar do adulto e focá-lo na infância. É um verdadeiro desafio, que oferece a quem o encara a oportunidade de despir-se do contexto histórico em que se está inserido e adotar para si uma nova atitude frente ao outro, de paciência, cuidado e empatia.