Comentário Geral 27: na foto, as mãos de um adulto seguram as mãos de uma criança

Comentário Geral 27: Alana envia contribuição à ONU sobre acesso à justiça para crianças e adolescentes

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Alana envia contribuição à ONU em temas como acesso à justiça para crianças com deficiência, ambiente digital e crise climática

Assegurar o acesso à justiça para crianças e adolescentes significa possibilitar a realização de processos judiciais e outras formas de resolução de conflitos que levem em consideração as necessidades desse grupo, garantindo que seus direitos sejam respeitados e, em casos de violação, que haja a reparação adequada. Isso inclui o reconhecimento de meninos e meninas como sujeitos de direitos, conforme estabelecido na Convenção sobre os Direitos da Criança da Organização das Nações Unidas (ONU) e no artigo 227 da Constituição Federal de 1988. Além disso, implica o direito de acessar tribunais de maneira justa e contar com proteção judicial efetiva. Nesse sentido, o Instituto Alana enviou contribuições para o Comentário Geral Nº27 (CG27) do Comitê dos Direitos da Criança da ONU, que deve ser lançado em 2026, com o tema “Acesso à Justiça e a remédios eficazes”. 

O CG27 tem como objetivos promover uma compreensão dos elementos críticos para garantir acesso à justiça e a remédios eficazes para todas as crianças e adolescentes; identificar barreiras práticas, legais, sociais e culturais que impedem as crianças de acessarem a justiça e orientar os Estados com ações necessárias para garantir soluções eficazes, que considerem a capacidade jurídica das crianças conforme a idade. Além disso, o documento visa capacitar crianças para que elas conheçam seus direitos e sejam capazes de reivindicá-los; adaptar o sistema judicial para as crianças e fornecer exemplos concretos e orientações aos Estados para estabelecer mecanismos eficazes que apoiem crianças e adolescentes que necessitam acessar a justiça.

“A grande maioria de crianças e adolescentes que têm seus direitos violados raramente recebe algum tipo de reparação. Permitir que as crianças reivindiquem seus direitos é essencial para a proteção, promoção e cumprimento de todos os direitos humanos”, afirma Pedro Mendes, advogado do Instituto Alana. Ele lembra que isso também faz parte do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 16.3, que determina a promoção “do Estado de Direito, em nível nacional e internacional, e garantir a igualdade de acesso à justiça para todos”.

Em sua contribuição para o CG27, o Alana recomenda que os casos envolvendo crianças sejam tratados dentro de tribunais especializados do Judiciário, envolvendo profissionais específicos, como psicólogos, assistentes sociais, sociólogos, entre outros, que sejam capazes de ouvi-las e permitir sua plena participação. As crianças também devem ter legitimidade jurídica, para que possam acessar mecanismos de justiça sem a representação de seus responsáveis legais, se necessário. Isso garante que seus melhores interesses sejam respeitados.

O Alana também acredita que as crianças devem ser informadas de que o acesso aos mecanismos de justiça e a recursos efetivos é possível e ter meios adequados a elas. “Para isso, é fundamental educá-las sobre seus direitos e os mecanismos disponíveis a que podem ter acesso, além de adaptar esses mecanismos e a forma como são oferecidos, como, por exemplo, especializar o sistema educacional e oferecer serviços online e por telefone”, explica Pedro Mendes. 

Acesso à justiça para crianças com deficiência

Crianças historicamente excluídas, como as com deficiência, meninas, negras e indígenas,  encontram-se em uma situação de maior vulnerabilidade, devido a estruturas discriminatórias que têm impacto também no Judiciário. Assim, o acesso à justiça deve ser abordado a partir de uma perspectiva interseccional, para que sejam oferecidas soluções personalizadas que atendam às necessidades únicas de cada criança. Por isso, o Alana, junto com a Federação Brasileira das Associações de Síndrome de Down (FBASD), Instituto Rodrigo Mendes, Instituto Jô Clemente, Mais Diferenças e o movimento Vidas Negras com Deficiência Importam, enviou uma contribuição ao CG27 com recomendações para garantir o acesso à justiça para crianças com deficiência. Esse documento destaca que as instalações e serviços do Judiciário devem ser universalmente acessíveis, incluindo acessibilidade arquitetônica, urbana e comunicacional. 

As crianças com deficiência devem ter acesso a recursos como linguagem simples, materiais de fácil leitura, intérpretes de linguagem de sinais, documentos em Braille e apoio para compreender conteúdos e decisões. Além disso, essas crianças devem contar com facilitadores que ofereçam suporte personalizado para entender seus direitos e participar ativamente de processos judiciais ou administrativos. Os recursos tecnológicos, como sistemas de audição assistiva, legendas em tempo real e softwares baseados em voz e texto, entre outros, também são essenciais para facilitar a participação ativa das crianças com deficiência, respeitando suas necessidades e direitos específicos.

Ambiente digital e crise climática

No mundo em que uma a cada três pessoas que usa a Internet é uma criança, é preciso olhar para os riscos da violação da privacidade dessas crianças e do uso de seus dados pessoais em grande escala para a publicidade, sem falar nos danos à saúde e ao desenvolvimento, como o vício em telas. Por isso, o Alana recomenda que os Estados devem garantir que as empresas que operam no ambiente digital adotem medidas de transparência para comunicar os riscos aos usuários em linguagem acessível e implementar medidas para mitigá-los, além de realizar avaliações de impacto sobre os direitos das crianças. Os países também devem garantir a alfabetização digital na infância e adotar marcos legais que estabeleçam a ilegalidade de todas as formas de violações dos direitos das crianças no ambiente digital, garantindo a reparação adequada.

Outra crescente ameaça aos direitos e ao futuro das crianças é a mudança climática, que impacta, principalmente, o Sul Global, onde vivem 75% das crianças do mundo e onde empresas multinacionais continuam a aplicar práticas exploratórias que afetam comunidades inteiras e fazem greenwashing para dificultar o acesso dessas populações à justiça. Em sua contribuição ao CG27, o Alana recomenda que os Estados criem mecanismos para responsabilizar empresas e outros atores por ações ou omissões que violem os direitos das crianças e, assim, garantam o cumprimento das obrigações relacionadas à justiça climática.

A elaboração do primeiro rascunho do CG27 deve acontecer em maio de 2025 e a aprovação do rascunho final, em janeiro de 2026. O lançamento global do documento está previsto para maio do mesmo ano, junto com a versão adaptada para crianças.